Dados do Trabalho
Título
USO DA TERMOGRAFIA NA AVALIAÇAO DA VIABILIDADE TECIDUAL DO COMPLEXO AREOLOPAPILAR APOS CIRURGIAS MAMARIAS DE RISCO
Resumo
Introdução
No início dos anos 1800, Sir William Herschel descobriu a radiação infravermelha. Em 1929, Kalman Tihanyi desenvolveu a primeira câmera infravermelha, detectando calor. Na medicina, a termografia por infravermelho (TIR) detecta aumentos de temperatura corporal devido à maior vascularização associada a patologias. Avaliar a vascularização após cirurgias plásticas e reconstrutoras, especialmente do Complexo Areolopapilar (CAP), é essencial. Necrose do CAP é uma complicação rara, mas significativa em mamoplastias redutoras (2%) e mastopexias (1%), ocorrendo frequentemente em grandes reduções mamárias. A necrose do CAP causa deformidades estéticas significativas e grande angústia para cirurgiões e pacientes.
Objetivo
Avaliar a eficácia da TIR na determinação precoce da perfusão tecidual dos retalhos mamários em cirurgias estéticas ou reconstrutoras com reposicionamento do CAP.
Método
Estudo prospectivo com pacientes submetidas a cirurgias mamárias por dois cirurgiões. As pacientes assinaram um termo de consentimento, com registros fotográficos e termográficos em diferentes períodos da cirurgia.
Resultados
Incluiu 23 pacientes, totalizando 46 mamas. Alterações termográficas foram observadas em 7 pacientes, revelando possíveis anormalidades.
Discussão
O comprometimento circulatório do Complexo Areolopapilar (CAP) geralmente resulta de congestão venosa, causada por fatores como pedículos longos, torção, compressão e fechamento apertado da pele. Isso se manifesta por enchimento capilar rápido, sangramento escuro e edema. A termografia tem limitações na detecção precoce de alterações de perfusão devido à baixa sensibilidade e resolução das câmeras atuais, além de influências externas de calor. Comparada ao exame físico, que oferece uma avaliação tridimensional, a termografia é bidimensional e menos detalhada. Avanços em câmeras termográficas poderiam melhorar a precisão na avaliação da perfusão tecidual.
Conclusão
A termografia tem limitações quando usada isoladamente em cirurgias de mama. É útil na avaliação de hematomas, mas não substitui o exame físico. Recomenda-se seu uso complementar dentro de um protocolo multimodal e o uso de equipamentos mais avançados em futuras pesquisas.
Introdução
No ano de 1800, Sir William Herschel efetuou medições de temperatura em cada uma das faixas do espectro visível de luz e notou um aumento de temperatura além da faixa vermelha do espectro, levando-o a denominar essa luz invisível como "infravermelho". Em 1929, o físico húngaro Kalman Tihanyi concebeu a primeira câmera sensível ao infravermelho, baseando-se no pressuposto de que todos os objetos emitem radiação infravermelha como sinal de calor. Por meio de uma câmera termográfica infravermelha, é possível detectar essa radiação de forma semelhante a uma câmera convencional que detecta a luz visível. (NYIRJESY, 1982, p. 401)
No contexto da avaliação e tratamento cirúrgico da paciente com câncer de mama, é possível verificar na literatura um número relevante de trabalhos abordando o uso da TIR para diagnóstico e detecção, entretanto, o uso da TIR não é abordado no cenário da avaliação da diminuição do fluxo vascular que levaria a alteração termográfica. (JOHN, 2016, p. 122)
Considerando a complexidade na manipulação cirúrgica das mamas, principalmente devido à variação anatômica do mapa vascular, faz-se necessário avaliar a vascularização após a realização de cirurgias plásticas e reconstrutoras. Nesta conjuntura, a avaliação detalhada do suprimento sanguíneo do Complexo Areolopapilar (CAP) no pós-operatório. (STEENBEEK, 2022, p. 4074)
Necrose do CAP tem sido relatada em 2% dos casos das mamoplastias redutoras e em 1% dos casos de mastopexia. Casos de epidermólise do CAP decorrentes do edema intradérmico ou subdérmico ocorrem em 5 a 11% dos casos. A isquemia e necrose do CAP ocorre mais frequentemente em casos envolvendo grandes reduções - ressecções acima de 1000g, em que um pedículo longo é criado para perfundir o CAP e, com isso, seus pilares, durante o fechamento, acabam comprimindo a circulação. (BATTISTI, 2018)
A necrose do complexo areolar papilar (CAP) é uma complicação pouco frequente, mas temida em cirurgias mamárias. Quando há perda significativa de tecido mamilar e/ou areolar, não resulta apenas em grandes deformidades estéticas, mas também pode ser uma fonte de grande angústia para o cirurgião e pacientes. (HANDEL, 2016)
Objetivo
Avaliar a eficácia da termografia infravermelha na determinação precoce da perfusão tecidual em pacientes submetidas a cirurgia estética ou reconstrutora com reposicionamento do Complexo Areolopapilar (CAP).
Monitorar alterações térmicas pós-operatórias para identificar precocemente complicações de perfusão, correlacionando variações de temperatura. Comparar a precisão da termografia com o exame físico e correlacionar os resultados com o desfecho de cada caso.
Método
Trata-se de um trabalho realizado de forma prospectiva baseado em dados colhidos no período de Junho de 2023 a Junho de 2024, envolvendo pacientes submetidas a cirurgias mamárias com necessidade de migração do CAP realizadas por 2 únicos cirurgiões.
• Assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido
• Registro fotográfico e termográfico em diferentes períodos da cirurgia mamária: Pré-operatório, pós-operatório imediato e pós-operatório tardio.
• Retrospectivamente realização de uma coorte por meios de avaliação sistemática dos dados nos casos que apresentaram alterações termográficas, assim como daqueles em que foi verificado complicações como epidermólise, necrose e hematoma.
• Avaliação das imagens termográficas de forma qualitativa e correlação com contexto e exame clínico.
A coleta de imagens termográficas será realizada por meio de dispositivo específico.
Declaro ausência de conflito de interesses.
Especificações da câmera termográfica utilizada:
• Modelo: FLIR ONE® Pro LT (gen 3)
• Faixa Dinâmica de Cena: - 20 °C – 120 °C
• Precisão: ±3 °C ou ±5%
• Resolução Térmica 80 × 60 (4.800 pixels)
• Resolução Visual 1.440 × 1.080
• Taxa de Quadros 8,7 Hz
Critério de exclusão:
• Cirurgias mamárias sem reposicionamento do CAP;
• Incapacidade de Consentimento ou Cooperação: Pacientes que não assinaram o termo de consentimento ou que têm dificuldade em cooperar com os procedimentos do estudo, garantindo que todas as participantes compreendem e aceitam os métodos do estudo.
Resultado
O estudo incluiu um total de 23 pacientes do sexo feminino, em um total de 46 mamas avaliadas. A média de idade foi de 38 anos (35-40). Todas foram submetidas à cirurgia mamárias de risco com reposicionamento do CAP em contexto estético ou reparador.
Alterações termográficas
Foram observadas alterações termográficas em 6 mamas, isoladamente. As imagens termográficas desses pacientes revelaram dados importantes, sugerindo possíveis anormalidades que merecem investigação adicional. Abaixo, apresentamos uma análise detalhada das imagens termográficas dos pacientes que apresentaram essas alterações:
Discussão
O comprometimento circulatório do CAP pode ser devido à insuficiência arterial, mas é mais comumente causada por congestão venosa. Sinais clínicos de congestão venosa inclui enchimento capilar excessivamente rápido, sangramento rápido e escuro à picada de agulha e cianose e edema do mamilo. O congestionamento pode ocorrer por vários motivos: preservação inadequada da drenagem venosa, longo pedículos, torção ou compressão do pedículo, fechamento excessivamente apertado da pele ou hematoma (HANDEL, 2016).
A congestão venosa pode ser evitada evitando pedículos longos evitando torções do pedículo usar sanguessugas para melhorar a drenagem venosa ou diminuir a tensão no CAP, reduzindo o volume do pedículo. Se, por outro lado, o suprimento de sangue arterial para o CAP é inadequado, nada pode ser feito para salvar o mamilo. A melhor maneira de evitar que isso aconteça é preservar um suprimento vascular adequado para o CAP usando a técnica cirúrgica correta. (VAN DEVENTER, 2008).
Em um dos casos (Figura 4) observou-se sinais clínicos de congestão venosa evoluindo necrose total do CAP esquerdo. Sua avaliação termográfica tardia apresentou-se pobre em alterações mesmo sendo claramente verificado no exame clínico. Em contrapartida a termografia foi um método complementar importante para a identificação rápida de um hematoma (Figura 1)
A temperatura dos tecidos vivos é influenciada por uma série de fatores, incluindo o metabolismo celular, o fluxo sanguíneo, a atividade muscular, e processos inflamatórios e infecciosos (HOLECEK, 2011).
A avaliação clínica da perfusão do retalho tem sido o método tradicional e mais utilizado para avaliar a adequação do suprimento sanguíneo remanescente, uma vez removida a mama subjacente. Os métodos tradicionais de avaliação da viabilidade de retalhos cutâneos incluem avaliação da cor da pele, enchimento capilar, temperatura da pele e sangramento dérmico. (SAYED, 2017). Apesar da termografia identificar alterações precoces (figura 7 e 8) essas as alterações já eram perceptíveis aos olhos do examinador. Desta forma o manejo da necrose superficial ocorreu independente dos achados termográficos.
O tecido tem a capacidade de absorver calor de fontes externas devido à sua natureza biológica e alta condutividade térmica (BALASUBRAMANIAM, 1977). Esse processo de transferência de calor pode influenciar a temperatura superficial do tecido, refletindo a temperatura do corpo adjacente (figura 5, 6 e 13). Como resultado, medições térmicas podem ser afetadas, dificultando a interpretação precisa de alterações de temperatura intrínsecas ao tecido. Portanto a utilização da termografia no período intraoperatório pode gerar resultados imprecisos (figura 3) pela transferência de calor com os materiais utilizados no ato operatório como o soro fisiológico utilizado para limpeza da pele, pinças, campos, ambiente frio do centro cirúrgico
O exame físico, conduzido por profissionais experientes, continua a ser um pilar fundamental na avaliação de patologias mamárias. Ele permite a palpação direta, a observação de alterações cutâneas e a avaliação da textura e consistência dos tecidos, oferecendo uma perspectiva tridimensional das anormalidades potenciais. Em contraste, a termografia fornece uma imagem bidimensional baseada em variações térmicas, que pode não capturar nuances importantes detectáveis ao toque. O exame físico e a termografia devem ser vistos como métodos complementares, em vez de substitutos.
As limitações da termografia são particularmente evidentes quando consideramos a resolução e sensibilidade das câmeras termográficas atualmente disponíveis. A baixa sensibilidade pode resultar em uma incapacidade de detectar mudanças térmicas sutis associadas a estágios iniciais de alterações dos retalhos. Isso é crítico, pois a detecção precoce é essencial para um prognóstico positivo.
A câmera termográfica utilizada no presente estudo, por exemplo, possui uma faixa dinâmica de cena de -20 °C a 120 °C e precisão de ±3 °C ou ±5%. Embora essas especificações sejam adequadas para diversas aplicações industriais e de diagnóstico preliminar, elas podem não oferecer a sensibilidade necessária para detectar variações térmicas sutis em tecidos vivos, que são cruciais para identificar alterações precoces na perfusão. A resolução térmica de 80 × 60 (4.800 pixels) da câmera limita a capacidade de capturar detalhes finos.
Câmeras termográficas mais avançadas oferecem melhor resolução térmica e espacial, maior precisão e taxas de quadros mais altas. Essas câmeras, embora mais caras, poderiam melhorar significativamente a acurácia e a confiabilidade dos resultados obtidos em estudos de perfusão tecidual. A implementação de dispositivos com especificações superiores em futuros estudos poderia fornecer dados mais robustos e detalhados.
Conclusão
A termografia, apesar de ser uma ferramenta tecnológica avançada, apresenta limitações significativas quando utilizada de forma isolada em cirurgias de mama. Os dados indicam que não é suficientemente fidedigna para detectar alterações de forma precoce ao ponto de impactar ou conduzir a conduta clínica. No entanto, mostrou-se útil para avaliar uma coleção, especificamente.
Portanto, a termografia deve ser utilizada como método complementar ao exame físico e outros diagnósticos dentro de um protocolo multimodal. Para futuras pesquisas, recomenda-se o uso de equipamentos termográficos mais avançados para melhorar a acurácia dos resultados.
Referências
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• NYIRJESY, I. Breast thermography. Clin Obstet Gynecol. 1982. DOI: 10.1097/00003081-198206000-00023.
• JOHN, H. E. et al. Infrared thermography in plastic surgery. Gland Surg, 2016. DOI: 10.3978/j.issn.2227-684X.2015.11.07.
• MILOSEVIC, M. et al. Early diagnosis of breast cancer. Technol Health Care, , 2018. DOI: 10.3233/THC-181277.
• STEENBEEK, L. M. et al. Imaging for perforator mapping in breast reconstruction. JPRAS, 2022. DOI: 10.1016/j.bjps.2022.06.100.
• BATTISTI, C.; FASOLIN, F. Deiscência do complexo areolomamilar pós-mamoplastia redutora. Rev Bras Cir Plást, 2018. DOI:
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• HANDEL, N.; YEGIYANTS, S. Managing Necrosis of the Nipple Areolar Complex. Clin Plast Surg, 2016. DOI: 10.1016/j.cps.2015.12.012.
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• VAN DEVENTER, P. V. et al. The Safety of Pedicles in Breast Reduction and Mastopexy. Aesthetic Plast Surg, 2008. DOI: 10.1007/s00266-007-9070-1.
• HOLEČEK, M. et al. Mechanical Properties of Living Cells. In: KLIKA, V. (ed.). Theoretical Biomechanics. London: IntechOpen, 2011. DOI: 10.5772/19437.
• BALASUBRAMANIAM, T. A.; BOWMAN, H. F. Thermal Conductivity of Biomaterials. J Biomech Eng, 1977. DOI: 10.1115/1.3426282.
Palavras Chave
Termografia; Aréola; Mamoplastia
Arquivos
Área
Cirurgia Plástica
Categoria
Cirurgia Plástica
Instituições
Hospital Daher - Distrito Federal - Brasil
Autores
VITOR VARJAO CHIANG, MARCELA CAETANO CAMMAROTA, JOSE CARLOS DAHER, BRUNO ESTEVES PEIXOTO, IGOR MOURA SOARES, DIEGO VALERIO BUENO