60º Congresso Brasileiro de Cirurgia Plástica

Dados do Trabalho


Título

LIPOASPIRAÇAO: COMO PREVENIR COMPLICAÇOES E MAXIMIZAR PRECAUÇOES

Resumo

A lipoaspiração foi o procedimento cirúrgico estético mais realizado no mundo em 2021, com mais de 1,9 milhões de procedimentos e um aumento de 24,8%, ultrapassando a cirurgia de aumento das mamas. Revisões bibliográficas das intercorrências graves e óbitos demonstram que a lipoaspiração não é um procedimento inócuo e os riscos inerentes ao procedimento necessitam de maiores estudos.

Introdução

A lipoaspiração foi o procedimento cirúrgico estético mais realizado no mundo em 2021, com mais de 1,9 milhões de procedimentos e um aumento de 24,8%, ultrapassando a cirurgia de aumento das mamas¹. Realizada para procedimentos estéticos, tem como objetivo a realização de procedimento cirúrgico em pacientes saudáveis com redução do acúmulo de gordura localizada, a chamada lipodistrofia, levando à melhora do contorno corporal². Revisões bibliográficas das intercorrências graves e óbitos demonstram que a lipoaspiração não é um procedimento inócuo, mas sim que demanda experiência e técnica dos cirurgiões plásticos e que necessita de ainda mais estudos³.

Objetivo

O trabalho tem como objetivo conhecer os riscos e analisar na literatura os meios de tornar o procedimento de lipoaspiração o mais seguro possível para os pacientes. Além disso, tem como objetivo secundário criar um protocolo simples e fácil para guiar os cirurgiões durante a conduta de casos de pacientes que realizarão o procedimento de lipoaspiração.

Método

Trata-se de uma revisão sistemática, um estudo retrospectivo, utilizou-se como base de dados a SCIELO (Scientific Electronic Library Online) e PUBMED (US) National Library of Medicine/ National Institute of Health ) através das ferramentas MeSH (Medical Subject Headings) com os descritores: "Lipectomy/adverse effects" OR "Lipectomy/history". E os termos “Lipectomy AND complications” na base de dados da SCIELO.

Resultado

No PUBMED encontrou-se 564 artigos relacionados com os termos de busca, dentre eles, selecionou-se as publicações dos últimos 10 anos e com texto completo de acesso gratuito, resultando em 40 publicações. Na SCIELO os termos utilizados foram “(LIPECTOMY) AND (COMPLICATIONS)” possibilitando o acesso a 28 artigos selecionados, destes, o período de publicação dos últimos 10 anos foi colocado como opção de inclusão, assim como área temática cirúrgica e “artigo” como o “tipo de literatura”, desta forma 22 artigos foram incluídos na leitura.
Foram selecionados 13 publicações relevantes no tema, dentre elas um questionário com 738 cirurgiões plásticos e suas experiências com complicações pós lipoaspiração – combinada ou não, a revisão de informações da Comissão de lipoaspiração da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) e revisões sistemáticas. Todas as publicações têm em comum as complicações após a cirurgia de lipoaspiração e formas de tornar o procedimento mais seguro.

Discussão

Duas situações, às vezes simultâneas, podem levar o cirurgião plástico a contraindicar uma lipoaspiração em um paciente saudável: obesidade e flacidez ², mas além delas, pacientes com doença cardiovascular e pulmonar grave, distúrbios de coagulação graves, incluindo trombofilias, pacientes com diabetes, tabagismo e gestação também são consideradas no pré-operatório, sendo contraindicações relativas ao procedimento cirúrgico. A lipoaspiração realizada para procedimentos estéticos de melhora de contorno corporal, tem como objetivo a retirada de gordura em pacientes saudáveis e redução do acúmulo de gordura localizada, a chamada lipodistrofia. Sabe-se que nas últimas três décadas, a lipoaspiração vem sendo aperfeiçoada ². Desde o seu surgimento, diversas evoluções técnicas têm sido demonstradas. A precursora das técnicas atuais de remoção de gordura foi a curetagem, denominada lipoexérese, apresentada por Schrudde, em 1972. 8-9. Illouz publicou sua técnica em 1980, em que utilizava cânulas rombas calibrosas de forma aspirativa para retirada da gordura. Um dos princípios de Illouz era a remoção apenas profunda da gordura, deixando 1 a 2cm do tecido celular subcutâneo superficial com o objetivo de evitar irregularidades, porém, como qualquer outro procedimento cirúrgico, não é isenta de complicações 2,10.
Apesar da falta de ensaios clínicos comparativos, e independente da técnica utilizada, a lipoaspiração moderna consagrou se como procedimento eficaz e seguro no tratamento do tecido adiposo em diversas partes do corpo, com índice muito baixo de complicações 6. Contudo, como todas as cirurgias, apresenta riscos inerentes à resposta metabólica e imunológica ao trauma cirúrgico e à anestesia. E, além disso, há a iatrogenia do trauma cirúrgico durante a ressecção do tecido adiposo que deve ser avaliada durante o procedimento.
Sabe-se que mesmo com toda a evolução e consagração do procedimento, a lipoaspiração pode determinar eventos desastrosos e, inclusive, fatais. As inúmeras complicações podem ser divididas em locais e sistêmicas (tabela 1) e devido a existência delas, em 2021 a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) deu início a Comissão de Lipoaspiração, com o objetivo de descobrir fatores envolvidos nas intercorrências graves e nos óbitos em lipoaspiração ocorridos no Brasil3. A abordagem foi realizada por meio de um questionário on-line a partir de um link anônimo e enviado aos e-mails cadastrados para mais de quatro mil cirurgiões plásticos, membros da SBCP.
Dos 4.441 cirurgiões plásticos da SBCP pesquisados neste estudo publicado em 2015, 738 (16,61%) responderam. Dos 738 participantes, 490 (66,39%) negaram intercorrências e 248 (33,60%) as tiveram. Dos 738 casos, 40 (5,4%) evoluíram para o óbito per ou pós-operatório. Foi notado que o número de óbitos em cirurgias combinadas foi quatro vezes maior que em cirurgias de lipoaspiração isolada. A associação entre cirurgias plásticas combinadas e óbito foi altamente significativa. A mudança de decúbito do paciente durante o procedimento (ventral para dorsal ou dorsal para ventral e/ou lateral) não foi relatada na maioria dos casos e houve 1,9% de óbitos neste grupo. No entanto, dos 51 casos em que o paciente foi reposicionado durante o procedimento, complicações com êxito letal esteve presente em mais da metade destes (52,9%). As principais intercorrências citadas foram trombose venosa profunda e embolia gordurosa. A razão de prevalência (RP) avaliou quanto foi a proporção de óbito na presença de um fator em relação à ocorrência de óbito em que não houve o mesmo fator. A RP mostrou maior proporção de óbitos na presença de causas desconhecidas, embolia gordurosa, cirurgias combinadas e trombose venosa profunda.
Também pensando em outras possíveis complicações, o artigo publicado na Revista brasileira de Cirurgia Plástica em 2012, fala sobre alguns casos pouco comuns que devem ser levados em consideração: um caso de lesão vascular com perfuração de grande vaso durante a lipoaspiração; dois casos de perfuração intestinal; quatro relatos de infecções bacterianas graves; um caso de herpes zoster; um relato de lesão ureteral e três artigos de perda da visão associada à lipoaspiração. Ainda assim, embolia gordurosa em lipoaspiração é uma condição rara, mas mais conhecida e com vários casos relatados, que representa grave desfecho do procedimento. Entretanto, os sintomas são inespecíficos e, muitas vezes, subestimados, não estando estabelecido o risco exato nos casos de lipoaspiração e devendo causar ainda mais cuidado pelos cirurgiões.2
Ademais, segundo o Conselho Federal de Medicina (CFM), como em qualquer procedimento, é dever do médico esclarecer o paciente sobre a indicação, riscos e prognóstico. Ao paciente, cabe usar seu direito de ter informações claras e completas sobre seu tratamento para minimizar dúvidas e melhorar seu pós-operatório. Fica implícito que os pacientes que desejam submeter-se a esta cirurgia devem ter conhecimento prévio sobre a qualificação do seu médico e de sua experiência com o procedimento. Ademais, informações de outros pacientes, credibilidade do profissional na comunidade médica e condições de funcionamento da instituição onde o mesmo trabalha também devem fazer parte da escolha do cirurgião pelo paciente. O CFM ainda reitera que os limites de retirada de tecido gorduroso previstos na Resolução permitem uma solução segura excelente para a quase totalidade dos casos: admite-se a retirada de até 7% do peso do paciente e em até 40% da extensão do corpo 11.
Preocupados com os desfechos no pós-operatório e participando dessa atualização da comunidade de cirurgiões plásticos dedicados à segurança do paciente, em 2009, nos EUA, o Evidence-Based Patient Safety Advisory for Ambulatory Surgery por Haeck et al.12 dedicou 17 páginas aos aspectos relevantes para a segurança do paciente durante e após uma lipoaspiração, sob a ótica da Medicina Baseada em Evidências, descrito resumidamente na tabela a seguir:
A crescente demanda pela lipoaspiração no cotidiano da cirurgia plástica, tem criado a necessidade de aprimorar as técnicas cirúrgicas e evitar complicações. Este procedimento é utilizado desde o tratamento de pequenas irregularidades até mudança de contorno corporal e auxilio no tratamento de doenças.12 Desse modo, buscando minimizar intercorrências, também vale ressaltar a necessidade do uso de protocolos de segurança antes, durante e após os procedimentos. Levando em consideração a importância de associar os riscos cirúrgicos, a profilaxia de eventos adversos e a experiencia de pós operatório vivenciadas por cirurgiões plásticos, este trabalho uniu o conhecimento de todos os artigos revisados para criar um checklist de cirurgia segura (anexo 1).

Conclusão

Como qualquer procedimento cirúrgico, a lipoaspiração apresenta riscos que podem ser diminuídos dependendo dos cuidados do paciente e do profissional. Sabe-se que é possível minimizar os riscos: seguindo o protocolo de cirurgia segura; optando pelo procedimento de lipoaspiração com indicações corretas, considerando desde a primeira consulta o exame físico e as perspectivas do paciente; realizar o manejo correto das medicações de uso habitual com a suspensão, ou não, em tempo hábil de pré-operatório; evitar mudanças de decúbito intra-operatório; respeitar o volume seguro a ser lipoaspirado de forma individualizada; realizar reposição de volume adequada; indicar profilaxias; evitar perda sanguínea; evitar associação de procedimentos que aumentem muito o tempo cirúrgico e seus riscos inerentes, assim, não ultrapassando o tempo cirúrgico de 3 horas. Em suma, o ideal é o paciente estar disposto a cumprir as orientações médicas e estabelecer uma relação médico-paciente que dê segurança com relação ao cumprimento correto de todas as etapas que envolvem a cirurgia, do pré-operatório até o pós-operatório, favorecendo um desfecho com bom prognóstico e melhores resultados.

Referências

1 MOUNT ROYAL, N.J., 9 de janeiro de 2023 /PRNewswire/ -- A Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (International Society of Aesthetic Plastic Surgery, ISAPS). Acesso em 17 de Novembro de 2023 < https://www.isaps.org/media/hdmi0del/2021-global-survey-press-release-portuguese-latam.pdf>.
2 Complicações em lipoaspiração clássica para fins estéticos. Rev Bras Cir Plást. 2012;27(1):135-40. Acesso em: < https://www.scielo.br/j/rbcp/a/G6pfmh4RVwLxcYQDQzF5WGB/?format =pdf&lang=pt>.
3 Intercorrências e óbitos em lipoaspiração: pesquisa realizada pela comissão de lipoaspiração da SBCP. Acesso em: < https://doi.org/10.5935/2177-1235.2015RBCP0117>.
4Lipoaspiração abdominal: evoluindo de alta para média definição. Acesso em 17 de Novembro de 2023 em: https://doi.org/10.5935/2177-1235.2021RBCP0059.
5. Critérios práticos para uma lipoaspiração mais segura: uma visão multidisciplinar. .
6. Sattler G, Eichner S. Komplikationem bei Eingriffen am Fettgewebe. [Complications of liposuction]. Hautarzt. 2013;64:171-9.
7, Hughes CE 3rd. Reduction of lipoplasty risks and mortality: an ASAPS survey. Aesthet Surg J. 2001;21(2):120-7.
8.Schrudde J. Lipektomie und lipexhaerese im Bereich der unteren Extremitäten. Langenbecks Archiv für Chirurgie. 1977 Dec;345(1):127-31. DOI: https://doi.org/10.1007/BF01305460.
9. Schrudde J. Lipexeresis as a means of eliminating local adiposity. Aesthetic Plast Surg. 1980 Dec;4(1):215-26. DOI: https://doi.org/10.1007/BF01575221.
10. Illouz YG. Surgical remodeling of the silhouette by aspiration lipolysis or selective lipectomy. Aesthetic Plast Surg. 1985;9(1):7-21. PMID: 2986432 DOI: https://doi.org/10.1007/BF01570678.
11. Conselho Federal de Medicina – Parâmetros para uma lipoaspiração segura. Publicado dia 06/02/2004. Acesso em: < https://portal.cfm.org.br/artigos/parametros-para-uma-lipoaspiracao-segura/>
12. 8. Haeck PC, Swanson JA, Gutowski KA, Basu CB, Wandel AG, Damitz LA, et al.; ASPS Patient Safety Committee. Evidence-based patient safety advisory: liposuction. Plast Reconstr Surg. 2009;124(4 Suppl):28S-44S. DOI: http://dx.doi.org/10.1097/PRS.0b013e3181b52fcd
13. Fernandes JW, Miró A, Rocha AAS, Mendonça CT, Franck CL, Itikawa WM. Critérios práticos para uma lipoaspiração mais segura: uma visão multidisciplinar. Rev. Bras. Cir. Plást.2017;32(3):454-466. Acesso em< http://www.rbcp.org.br/details/1879/pt-BR/criterios-praticos-para-uma-lipoaspiracao-mais-segura--uma-visao-multidisciplinar>.

Palavras Chave

Lipoaspiração; complicações; efeitos adversos

Arquivos

Área

Cirurgia Plástica

Categoria

Cirurgia Plástica

Instituições

Serviço de Cirurgia Plástica Dr Ewaldo Bolívar de Souza Pinto - São Paulo - Brasil

Autores

JUAN CARLOS CESPEDES ESCOBAR, BEATHRIZ FERNANDA REIS DE GOES, LARA DIAS CASTRO CAVALCANTE, HERALDO CARLOS BORGES INFORZATO, PRISCILA CHIARELLO DE SOUZA PINTO ABDALLA, MARIANNA AUGUSTA SANSONI CARDOSO GOMES