60º Congresso Brasileiro de Cirurgia Plástica

Dados do Trabalho


Título

RECONSTRUÇAO DE COURO CABELUDO APOS EXERESE DE CARCINOMA DE CELULAS ESCAMOSAS AVANÇADO: RELATO DE CASO.

Resumo

O Carcinoma de Células Escamosas é um dos tumores malignos de pele mais prevalente. O seu tratamento é cirúrgico e em lesões avançadas pode resultar em grandes defeitos com necessidade de reconstrução. Na região do couro cabeludo, existem diversas técnicas disponíveis para o reparo. Discute-se no presente trabalho um caso de um paciente de 78 anos submetido a ressecção de carcinoma de células escamosas em couro cabeludo e submetido a reconstrução utilizando-se técnica mista, com confecção de retalho miocutâneo para cobertura de crânio sem pericrânio e enxerto de pele nas áreas cobertas. Discute-se a importância do cirurgião plástico dominar diversas técnicas para melhor programação e adequado tratamento cirúrgico.

Introdução

O Carcinoma de Células Escamosas (CEC) é o segundo tipo histológico mais comum de câncer de pele, caracterizado pelo crescimento anormal e acelerado de células escamosas. Normalmente se desenvolve em áreas de pele fotolesada e se apresenta com variadas lesões cutâneas. Quando detectados precocemente, a maioria dos CEC são curáveis. No entanto, devido a sua potencial evolução rápida e dificuldade de acesso aos serviços de saúde pela população, não é incomum o achado de grandes lesões as quais, mesmo quando ressecáveis, resultam em elevada morbidade devido aos grandes defeitos resultantes, sendo essencial a intervenção de uma equipe de cirurgia plástica reparadora.

Objetivo

Descrever relato de caso de reconstrução complexa de couro cabeludo em oncologia e discutir as possibilidades terapêuticas para o tratamento de grandes defeitos nesta topografia.

Método

O presente relato de caso foi realizado por meio de revisão do prontuário, registro fotográfico, além de revisão da literatura através da base de dados PUBMED e UpToDate®.

Resultado

Paciente masculino, 78 anos, branco, independente para atividades de vida diária, portador de Leucemia Linfóide Crônica, doença renal crônica, hipertenso, dislipidêmico, tabagista, encaminhado ao serviço de dermatologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HC-UFMG) devido a lesões extensas em couro cabeludo, inicialmente percebidas em dezembro de 2023, de crescimento progressivo e rápido, com aumento nos 04 meses que antecederam a admissão. Foi submetido a ressecções seriadas em outros serviços, sem sucesso.
Foi levado ao bloco cirúrgico do HC-UFMG em 08/04/2024, pela equipe da Cirurgia de Cabeça e Pescoço (CCP), para exérese da lesão neoplásica em couro cabeludo. Nesse primeiro momento, a equipe optou por realizar exérese com margem ampla de toda a região acometida, buscando a preservação do periósteo saudável e não acometido, bem como parte do osso temporal e occipital acometidos (utilizado dril e martelo).
Também foram realizadas perfurações (até a Díploe) com o uso do Dril em região parietal esquerda para formação de tecido de granulação e viabilização de enxerto em um segundo tempo cirúrgico. O procedimento foi efetuado sem intercorrências e o paciente permaneceu estável. Realizou o pós operatório em enfermaria.

Num segundo momento, a equipe da Cirurgia Plástica foi acionada para realizar a reconstrução do couro cabeludo. A calota craniana estava exposta e havia áreas com e sem revestimento periosteal. Durante a programação, foram levantadas diversas possibilidades de reconstrução, incluindo a confecção de retalho microcirúrgico.
Em 16/04/2024, o paciente foi submetido a reconstrução de couro cabeludo. Após discussão entre as equipes, foi optado por realizar retalho miocutâneo baseado na artéria temporal superficial esquerda para cobertura de área sem periósteo e enxerto de pele no restante da ferida, tendo em vista menor morbidade e vulto cirúrgico.
Recebeu alta no 3º DPO, com orientações gerais, antibioticoprofilaxia estendida e retorno ambulatorial precoce (6º DPO) para reavaliação e troca de curativo.
Em 22/04/2024, o paciente queixava edema peri-orbital e em membros inferiores, já em melhora. Negava dor, drenagem de secreção ou demais sintomas. Tolerando direta livremente, diurese e hábitos intestinais preservados. Foi retirado o curativo da área receptora, sendo observadas pequenas áreas de enxerto inviáveis, notadamente em regiões com pequenos seromas, que foram drenados. Restante do enxerto estava bem aderido ao leito, e o retalho encontrava-se bem perfundido.
Em 08/05/2024, retornou para acompanhamento da ferida. Mantinha-se sem exposição óssea e já apresentava tecido de granulação em região de perda de enxerto. O retalho estava totalmente viável e bem perfundido. Foi realizada a troca de curativo da área doadora e orientado curativo com petrolato nas demais regiões.
Até o presente momento, paciente segue em acompanhamento com a cirurgia plástica, realizando troca diária de curativo até completo fechamento da ferida por segunda intenção.

Discussão

O Carcinoma Espinocelular Cutâneo (CEC) é o segundo câncer humano mais comum. O CEC localizado, altamente curável mediante tratamento cirúrgico, ocorre com mais frequência; metástases locorregionais ou à distância se desenvolvem em < 1 a 5% dos casos.
A exérese das lesões muitas vezes resulta em grandes defeitos e, especialmente nas que acometem a cabeça e o pescoço, a reconstrução pode ser desafiadora. Tamanho e profundidade do defeito, qualidade da pele adjacente e presença de exposição ou defeito ósseo e estado geral de saúde do paciente são alguns dos fatores que devem ser levados em consideração no momento de escolha da técnica de reconstrução. Seguindo os princípios de Millard, sempre que possível um tecido deve ser substituído por outro semelhante.
O fechamento primário é uma boa opção para defeitos pequenos, quando a ferida é fechada sem tensão. Fechamento por segunda intenção ou fechamento assistido a vácuo são opções para pequenas feridas sem exposição óssea em locais de menor importância estética. O uso de expansores teciduais também pode ser considerado para defeitos que acometem menos de 50% da área do couro cabeludo.
Enxertos de pele são opções simples nos casos em que as condições clínicas do paciente impeçam procedimentos mais complexos, bem como permite o monitoramento de recidivas locais da doença. Ressalta-se a importância de tecido bem vascularizado adjacente para adequada integração do enxerto ao leito da ferida.
Retalhos locais são boas opções para defeitos de tamanho pequeno a moderado, sendo preferidos retalhos longos com bases amplas. Estes retalhos podem ser baseados em apenas uma das artérias responsáveis pelo suprimento sanguíneo do couro cabeludo, com adequada viabilidade. Podem ser necessários múltiplos retalhos locais para a reconstrução, sendo descritas diversas técnicas, como o retalho Juri e o retalho de Orticochea.
No caso em questão, a reconstrução foi realizada num segundo tempo, após confirmação anatomopatológica de margens livres de doença. Foi optado por confecção de retalho miocutâneo baseado na artéria temporal superficial para cobertura de área com exposição óssea seguida de enxerto de pele no restante da ferida, com bons resultados.
Retalhos regionais também podem ser úteis para o fechamento de feridas. Destacam-se os retalhos de músculo trapézio, grande dorsal e peitoral maior. Ressalta-se que nenhum deles alcança o vértice do couro cabeludo, sendo utilizados para reconstruções mais periféricas. Nos defeitos complexos, com exposição de estruturas nobres, em que ténicas locais ou regionais não são suficientes, os retalhos microcirúrgicos tem papel importante.
No caso apresentado, foi optado, seguindo os princípios de escala de reconstrução, por uma técnica mista com retalho local + enxerto de pele, considerando um vulto cirúrgico menor – o que é especialmente importante em pacientes com piores condições de saúde e múltiplas comorbidades – deixando ainda reservados retalhos regionais e reconstrução microcirúrgica na ocorrência de complicações com necessidade de novas reconstruções.

Conclusão

Os Carcinomas de Células Escamosas são tumores não melanomas com alta incidência no Brasil. A identificação precoce da lesão e o seu tratamento específico são fundamentais para a cura do paciente, com menor risco de óbito, metástases e de recidiva das lesões. O caso apresentado expõe de forma didática o seguimento de um paciente com lesões avançadas e é útil para exemplificar a importância da identificação precoce da lesão e tratamento adequado. O cirurgião plástico tem fundamental importância nesse contexto e sua atuação no momento da reconstrução deve ser individualizada, levando em consideração o estado geral do paciente e as condições locais da ferida. Existem diversas modalidades cirúrgicas para a região e a reconstrução pode ser desafiadora. O conhecimento de diferentes técnicas permite ao cirurgião plástico grande versatilidade para o completo tratamento do paciente enfermo.

Referências

Seitz IA, Gottlieb LJ. Reconstruction of scalp and forehead defects. Clin Plast Surg. 2009;36:355-377.

CIRURGIA craniomaxilofacial e cirurgia de cabeça e pescoço. In: CIRURGIA Plástica. 3. ed. [S. l.]: Elsevier, 2015. v. 3, cap. Reconstrução de couro cabeludo e da fronte, p. 105-133. ISBN 978-85-352-7797-5.

UPTODATE®. Cutaneous squamous cell carcinoma (cSCC): Clinical features and diagnosis. Disponível em: "cSCC: Clinical features and diagnosis". Acesso em: 20 abr. 2024.

UPTODATE®. Cutaneous squamous cell carcinoma: Epidemiology and risk factors. Disponível em: "cSCC: Epidemiology and risk factors". Acesso em: 20 abr. 2024.

Palavras Chave

reconstrução; couro; cabeludo.

Arquivos

Área

Cirurgia Plástica

Categoria

Cirurgia Plástica

Instituições

HOSPITAL DAS CLÍNICAS DA UFMG - Minas Gerais - Brasil

Autores

ANDRE CARNEIRO ROCHA, BRUNO MEILMAN FERREIRA, PALOMA APARECIDA FREITAS DUARTE, ISABELLA BRISA GONTIJO BUENO, ANA CELIA HOLLANDA CAVALCANTI GUIMARÃES, PAULO ROBERTO NOLLI FILHO