60º Congresso Brasileiro de Cirurgia Plástica

Dados do Trabalho


Título

SINDROME DE FOURNIER: DA EPIDEMIOLOGIA A RECONSTRUÇAO PERINEAL COM RETALHO FASCIOCUTANEO DE COXA BILATERALMENTE- UM RELATO DE CASO

Resumo

O seguinte trabalho traz um panorama geral da Síndrome de Fournier, baseado em em um caso ocorrido no Hospital Estadual Getúlio Vargas/ Rio de Janeiro, que corrobora com os dados encontrados na literatura. Além disso, objetiva mostrar a possibilidade de reconstrução das lesões através do retalho fasciocutâneo superomedial da coxa.

Introdução

A gangrena de Fournier foi descrita inicialmente em 1883 e é uma doença rapidamente progressiva dos tecidos da área genital e perianal com alta taxa de mortalidade, que geralmente afeta homens (10:1) com idade maior que 50 anos, sendo a perda da pele da região escrotal e perineal muito comum. Mulheres e pacientes de qualquer idade também podem ser afetados. A fisiopatologia mais aceita é de uma infecção polimicrobiana que causa microtromboses de arteríolas cutâneas e subcutâneas e disseminação perifascial de bactérias, causando gangrena dos tecidos sobrejacentes. Os microrganismos mais frequentemente isolados entre os Gram negativos aeróbios são Escherichia coli, Klebsiella pneumoniae, Pseudomonas aeruginosa e Proteus mirabilis. Entre os aeróbios Gram positivos destacam-se o Staphylococcus aureus, o Staphylococcus epidermidis, Streptococcus viridans e o Streptococcus fecalis. Os anaeróbios estão representados pelo Bacteróides fragilis, Bacteróides melaninogenicus, cocos Gram positivos e Clostridium species (não perfringens). Atuando de maneira sinérgica essas bactérias são responsáveis pela rápida disseminação do processo. Comorbidades como diabetes mellitus, alcoolismo, obesidade e condições que levem a imunossupressão são comuns e podem ser consideradas fatores de risco. A clínica do paciente inclui dor súbita e edema genital ou perineal, febre e prostração, progredindo para necrose tecidual com saída de secreção purulenta, crepitação ou flutuação e choque séptico. Exames de imagem (principalmente a tomografia computadorizada) são úteis para avaliar a extensão da doença. O diagnóstico e o tratamento precoces são essenciais no manejo da gangrena de Fournier, visto a gravidade do quadro. O desbridamento cirúrgico agressivo do tecido desvitalizado é obrigatória, além de troca frequente dos curativos, reposição volêmica intensiva e antibióticos de amplo espectro para cocos gram-positivos, bacilos gram-negativos e anaeróbios. Uma colostomia para derivação do trânsito intestinal pode ser benéfica para evitar o risco de contaminação fecal da ferida. Apesar do tratamento adequado, a mortalidade é alta, variando de 3 a 67 por cento. As causas de morte incluem sepse, coagulopatia, insuficiência renal aguda e cetoacidose diabética. Pacientes com fonte anorretal de infecção parecem ter a maior taxa de mortalidade. Após o tratamento primário da doença, os pacientes podem precisar de reconstrução secundária de defeitos de pele e tecidos moles. A reconstrução escrotal deve manter as características fisiológicas e estéticas dentro do possível, com espessura de pele e subcutâneo adequadas, resistente à tração e movimentos e que mantenha a termorregulação dos testículos. Múltiplas técnicas são descritas na literatura, não havendo uma ideal. A escolha vai depender do tamanho e localização do defeito, bem como, preferências da equipe cirúrgica e do paciente. Este trabalho tem como objetivo descrever o caso clínico do paciente e como este corrobora com os dados da literatura, além de mostrar a utilização do retalho fasciocutâneo superomedial da coxa para a reconstrução escrotal após desbridamento cirúrgico de região perineal por Gangrena de Fournier.

Objetivo

Descrever o caso clínico de Síndrome de Fournier corroborando com os dados da literatura, além de mostrar a utilização do retalho fasciocutâneo superomedial da coxa para a reconstrução escrotal após desbridamento cirúrgico de região perineal por Gangrena de Fournier.

Método

Relato de caso de um paciente de 48 anos, portador de Diabetes Mellitus Tipo 2 sem tratamento, que foi admitido no Pronto Socorro do Hospital Estadual Getúlio Vargas com relato de dor e eritema em região perineal com 3 dias de evolução, sendo diagnosticado Gangrena de Fournier. Foi realizado desbridamento cirúrgico de tecido desvitalizado da base do pênis até Glúteo esquerdo, antibioticoterapia de amplo espectro, e acompanhamento com a comissão de curativos que indicou curativo com PHMB e Papaina 10%. Após 5 dias do primeiro procedimento cirúrgico foi realizada a derivação de trânsito intestinal por meio de sigmoidostomia. Após compensação clínica, e melhora do aspecto da ferida, foi solicitado avaliação da equipe de Cirurgia Plástica. Ao exame apresentava grande lesão perineal com cerca de 95% de tecido de granulação sem sinais flogísticos, estendendo-se do glúteo esquerdo até testiculo, com exposição do mesmo. Após 20 dias da internação hospitalar, foi realizado confecção de retalho fasciocutâneo superomedial da coxa bilateralmente para cobertura da ferida. Foram delineados dois retalhos fasciocutâneos de coxa bilateralmente, cada um medindo aproximadamente 12 cm x 8 cm. Os retalhos foram cuidadosamente elevados, preservando o pedículo vascular principal e transpostos para o defeito perineal e suturados em camadas, garantindo uma cobertura adequada e tensionamento mínimo. O paciente foi monitorado quanto a sinais de viabilidade dos retalhos e infecção, com cuidados de ferida rigorosos e suporte nutricional. Apresentou boa evolução recebendo alta hospitalar no décimo terceiro dia de pós operatório.

Resultado

O procedimento de reconstrução foi bem sucedido, com viabilidade completa dos retalhos e sem sinais de necrose ou infecção. O paciente apresentou melhora significativa na dor e na função perineal, com cicatrização completa observada em 6 semanas pós-operatórias. A função urinária e sexual foram preservadas, e a satisfação estética foi alta.

Discussão

O tratamento inicial da Síndrome de Fournier, com antibioticoterapia de amplo espectro associado ao desbridamento completo de tecidos desvitalizados, preservando os tecidos viáveis é de fundamental importância. Após este tratamento inicial, com a ferida apresentando tecido de granulação, está indicado o tratamento reconstrutor, que visa cobrir a ferida com o melhor resultado estético possível. Este período varia de acordo com as condições do paciente, que possam interferir na regeneração tecidual.. Alguns procedimentos podem atingir esses objetivos: enxerto de pele parcial, enxerto de pele total, retalhos de avanço, retalhos fasciocutâneos, musculares ou miocutâneos. O ideal é aquela que permita funcionalidade adequada e aspecto mais estético possível. O retalho súpero-medial da coxa foi descrito pela primeira vez por Hirshowitz para reconstruir escroto e vulva. Ele possui rica vascularização, principalmente a partir dos ramos da artéria femoral (pudendo interno e circunflexo), sendo utilizado com segurança em pacientes diabéticos e vasculopatas. Ele repõe satisfatoriamente as áreas perdidas de pele escrotal, é de fácil e rápida execução técnica e produz excelentes resultados estéticos tanto na área doadora como receptora, com cicatrizes em locais pouco visíveis
Além destas vantagens, o retalho súpero-medial da coxa é confeccionado em tempo único, sem sequelas à área doadora e traz de volta o equilíbrio psicológico do acometido em relação à cobertura das estruturas genitais, até então expostas. O retalho apresenta tecido semelhante ao do escroto, contendo inclusive pelos, preservação da sensibilidade local pela inclusão dos nervos ilioinguinal e ramo genital do nervo genitofemoral. A maior desvantagem do retalho é a disponibilidade da área doadora da coxa, que em pacientes jovens pode ser escassa pela pouca flacidez da região.

Conclusão

A utilização de retalhos fasciocutâneos de coxa bilateral mostrou-se eficaz na reconstrução perineal de um paciente com síndrome de Fournier, resultando em uma cobertura tecidual adequada, preservação funcional e alta satisfação estética. Este caso reforça a viabilidade e a eficácia desta técnica reconstrutiva em situações de perda tecidual extensa na região perineal.

Referências

1 - Smith GL, Bunker CB, Dinneen MD. Fournier´s gangrene. Br J Urol 1998; 81: 347-55.

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4.Yanar H, Taviloglu K, Ertekin C, Guloglu R, Zorba U, Cabioglu N, Baspinar I. Fournier´s Gangrene : Risk factors and strategies for management. World J Surg 2006; 30: 1750-4.

Palavras Chave

Fournier; reconstrução; retalho

Arquivos

Área

Cirurgia Plástica

Categoria

Cirurgia Plástica

Instituições

HOSPITAL ESTADUAL GETÚLIO VARGAS - Rio de Janeiro - Brasil

Autores

EMERSON WESLEY DE FREITAS CORDEIRO, LIZA MARIA SAMPAIO DE BRITO, CAMILA MARIA NASCIMENTO FIRME, LEONARDO AUGUSTO DE CARVALHO SANTOS, JÉSSICA VICTOR DE LACERDA CABRAL, KAIO DANILO LEITE DA SILVA ROCHA